frutos de sombra













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    domingo, 13 de julho de 2008


    No meu bairro (1)
    Não gosto de bairros fotocópia, com os apartamentos todos iguais de aspiração central e garagens com portões eléctricos que dão para um acesso bordado a relva que ali está para aparecer nos panfletos promocionais cheios de espaços verdes e para as crianças afinal não brincarem porque nunca se sabe isto hoje em dia, viu o que deram ontem nas notícias. Os carros saem todos de manhã, dois por casa, um com uma pessoa, outro com duas ou três, que ainda vou ter de parar em duas escolas a largar as crianças, depois vais tu buscá-las logo à tarde que tenho uma reunião. Nas primeiras semanas precisamos do gps para saber onde moramos porque a Câmara Municipal ainda não pôs os números de polícia e não é fácil distinguir o nosso lote dos outros, rua A, rua B, lote II-D. Aos fins-de-semana continuam os carros a sair todos das garagens para ir ao supermercado, ao centro comercial, à praia, almoçar à casa igual dos primos iguais.

    No meu bairro gosto de depois do jantar dar uma volta a pé pelo jardim, pelas ruas estreitas a descobrir novas casas velhas. Gosto de ir a pé à praça ao sábado de manhã, parar na padaria a comprar um palmier e espreitar os títulos dos jornais. Gosto de entrar em lojas em que os clientes são tratados por “Bom dia Sr. João” e já aqui moram há mais anos do que eu vivo. Gosto de à saída do supermercado me cruzar com aquela senhora que trabalha nos correios e tem a filha em Inglaterra onde foi mãe há pouco tempo (não, não é dirigente de nenhum partido político em part-time). Gosto de ir a pé à praia e à entrada me cruzar com aquele senhor das Finanças que é baixote, tem bigode e não achou piada quando lá fui pagar a sisa de uma casa com mais de 100 anos, o que implicava ele ter de subir o escadote até às prateleiras mais altas e que me fez pensar em Todos os Nomes do Saramago, onde se explica que a organização piramidal da hierarquia do trabalho está organizada de maneira a que só passa ao nível de cima o que a pessoa do nível de baixo não conseguir fazer, de tal forma que quando se chega ao topo da pirâmide já não há nada para fazer. E penso que normalmente a realidade não é esta, pelo menos nas experiências por onde tenho passado, mas a descrição tem na mesma a sua graça – foi com as crónicas do MEC que aprendi que compreender não é o mesmo que concordar.
    Gosto de fazer compras na praça em que o preço das frutas e dos legumes é explicado "olhe que já vi hoje aqui cerejas iguais a estas mas a 5 euros".

    # Jorge Moniz |