frutos de sombra













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    terça-feira, 26 de agosto de 2008


    Fios
    Os meus pais são, por definição, imortais. É um dado adquirido. De vez em quando
    (e as vezes vão sendo mais que os quandos à medida que os anos passam)
    tentam provar-me o contrário. Alguma maleita aqui e ali, ou então as conversas das coisas que é preciso eu saber. Os locais exactos dos terrenos, as gavetas dos documentos, as contas nos bancos, até os percursos das canalizações por baixo da calçada.

    Estivemos por estes dias entretidos com algo que já nem me lembrava existir e que fazia parte de muito recém-nascido há cerca de 3 décadas.
    (porventura continuará a fazer nalgumas famílias hoje em dia)
    Falo dos fios, das pulseiras, das medalhas, das cruzes, das moedas, das libras. Em duas palavras, o ouro e a prata. Guardados por aí algures em embalagens de medicamentos usadas para os ladrões não descobrirem.
    Decidiram que é altura de passar eu a guardar as minhas peças, porque qualquer dia eles já não estão cá e nós os filhos deitamos aquilo tudo fora sem ver o que é.

    Confesso não atribuir grande valor sentimental a fios que nunca usei e sempre estiveram adormecidos no algodão azul da caixinha quadrada de plástico com tampa de números de telefone antigos. Houve no entanto uma excepção, um fio que não era meu e que a minha mãe me atribuiu numa partilha decidida no instante. Inconscientemente deve ter funcionado o mecanismo de ‘o que é do homem vai para o homem e o que é da mulher vai para a mulher’ e dei por mim segurando o fio que toda a vida se pendurou no pescoço do meu avô. Este sim, reconhecê-lo-ia em qualquer parte. Não saberia descrever em detalhe as peças que se penduram nele, mas aquele nó dado na ponta para o encurtar é a cara do meu avô. É o meu avô.

    # Jorge Moniz |